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Na rota dos festivais:
uma tradição que se renova
Os discursos sobre origem tendem a impor aos estudos um caminho que se pressupõe descobridor, mas há de se pensar se estes não já nascem imbuídos de uma aura que rotula todos ao redor como iguais e diferentes, trazendo em seu bojo um ranço etnocêntrico oriundo da ideia do marco fundador que, em sua essência, busca dicotomizar os sujeitos, fazendo emergir, uma vez mais, o olhar do colonizador eternamente receoso de abrir mão dos seus colonizados. Os ventos sopram.
Sendo difícil precisar onde estão e quais são as supostas raízes da cantoria nordestina, o que interessa aqui é perceber como essa prática cultural se insere na dinâmica social brasileira. No afã de construir uma identidade nacional, num dado momento buscou-se nas expressões populares um alicerce colaborativo para a delimitação de características que pudessem representar um perfi l que supostamente representaria o povo brasileiro. Assim, como forma de desvencilhar-se das infl uências europeias, como se isso fosse possível de fato, deu-se início à constituição de um discurso que buscava na sociedade brasileira elementos que pudessem ser apontados como constituintes identitários desta. Imbuído de uma paixão pelas belezas, pelas terras e pelas produções brasileiras, Mário de Andrade iniciou uma expedição pelo interior do país com o objetivo de ter contato com expressões culturais desenvolvidas em lugares e em condições geralmente desconhecidas para o grande público brasileiro. Em suas andanças, o autor conheceu mani-festações que o encantaram a ponto de ver nelas a verdadeira representação brasileira, mas já aí encontram eco os discursos que apontam a constituição dessa sociedade como oriunda das diversas infl uências dos povos que por aqui passaram: Se fosse nacional só o que é ameríndio, também os italianos não podiam empregar o órgão que é egípcio, o violino que é árabe, o cantochão que é greco-hebraico, a polifonia que é nórdica, anglo-saxônica fl amenga e o diabo. Os franceses não podiam usar a ópera que é italiana e muito menos a forma de sonata que é alemã. (Andrade, 2006, p. 15) Assim, abrem-se as portas para a adoção de olhares que passaram a ver muitas expressões, antes menosprezadas, como atestados da brasilidade que tanto se buscava para esses solos. Entretanto, é Ortiz (2006) quem nos chama a atenção para elementos que separam a memória coletiva da memória nacional, apontando para o que constitui a identidade: É através de uma relação política que se constitui assim a identidade; como construção de uma segunda ordem ela se estrutura no jogo da interação entre o nacional e o popular, tendo como suporte real a sociedade global como um todo. Na verdade, a invariância da identidade coincide com a univocidade do discurso nacional. Isso equivale a dizer que a procura de uma “identidade brasileira” ou de uma “memória brasileira” que seja em sua essência verdadeira é na realidade um falso problema. A questão que se coloca não é de se saber se a identidade ou memória nacional apreendem ou não os “verdadeiros” valores brasileiros. A pergunta fundamental seria: quem é o artífi ce dessa identidade e dessa memória que se querem nacionais? A que grupos sociais elas se vinculam e a que interesse elas servem? (Ortiz, 2006, p. 139) Essa memória coletiva colabora para a manutenção de práticas culturais que precisam ser ressignifi cadas a fi m de conviver com as novas demandas sociais e com as tantas expressões que tendem a surgir em função dos meios tecnológicos disponíveis. O desenvolvimento de novos e variados media passa a dar visibilidade a sujeitos e práticas que não cabiam nos suportes convencionais, cuja produção extrapola os limites que se querem fi xos entre o real e o imaginário, entre o público e o privado, entre o coletivo e o individual, mas as relações de poder que se estabelecem não podem ser medidas nem dependem tão somente dos atores diretamente envolvidos, mas também do poder que emana dos saberes que circulam no imaginário daqueles que acompanham e colaboram indiretamente para a disseminação e para o fortalecimento de variadas expressões culturais.
Tremem as cordas das violas
Entendida como uma modalidade poética oral e improvisada, com regras fi xas e modalidades, e acompanhada pelo som da viola por violeiros que duelam, a cantoria de improviso está presente no solo nordestino há tempo sufi ciente para ser reconhecida como um elemento da representatividade nordestina, mas o que será que isso de fato representa? Criados geralmente nas zonas rurais dos mais diversos estados do Nordeste, oriundos de famílias humildes, crescidos ao som das músicas que embalavam e embalam as mais diversas festividades familiares ou até mesmo apenas para preencher o vazio muitas vezes deixado pelo silêncio, os repentistas se dizem fascinados pela viola desde sempre. Relatam que seus pais promoviam cantorias em suas casas, que esses momentos enchiam os lares com o cheiro de pessoas dançando e com o barulho da comida no fogão de lenha. Tendo alguns sido iniciados na arte do improviso pelos próprios pais ou por irmãos mais velhos, outros conheceram as cordas da viola pela mão de cantadores próximos que admiravam à distância, que são apresentados como padrinhos poéticos. Esse gosto pelo canto aprimora-se com a prática, mas é a referência ao dom que marca o discurso dos cantadores. Todos afi rmam que cantar é um dom, mesmo que este possa ser aprimorado por uma prática constante. Essa alusão à infl uência divina cerca os cantadores com uma aura protetora, que os defende de possíveis críticas que venham a sofrer. Formados pelas experiências da vida, não é geralmente nos bancos escolares que esses sujeitos vão encontrar os saberes que procuram e precisam, mas isso de modo algum diminui a reverência que fazem aos materiais escritos e à importância da educação formal para a sua constituição cidadã. Empunhando uma viola, um chapéu de couro, uma roupa mais formal e uma postura de cantador, eis que surge aquele que se propõe a entreter a plateia com seus galanteios, com suas observações satíricas, com seu discurso que refl ete os tantos preconceitos presentes na sociedade brasileira, mas principalmente com sua poesia que não cabe nos versos e se espalha pelos presentes, de ouvido em ouvido, em um crescendo que só se satisfaz quanto todos estão com os olhos grudados na direção do som e quando os ouvidos estão todos atentos para apontar tanto os acertos quanto os deslizes, caso ousem fugir aos ditames dessa arte. Forjando um discurso que busca ser geral, os repentistas apresentam em seus versos elementos que os fi liam aos mais diversos discursos, visto que falam livremente sobre os mais variados temas. A postura do cantador precisa corresponder ao que se espera do homem sertanejo, viril, corajoso, defensor da honra, dos bons costumes, da família, da amizade, da lealdade, da religião, seja ela católica ou não, mas dentro dos limites que julgam aceitáveis conforme os parâmetros sociais.
E os pés saem das paredes
Há quem diga que o nome pé de parede é uma denominação literal, pois os cantadores se encostavam nas paredes e colocavam os pés nela para o devido apoio ao peso da viola. Mas me parece também que os pés1, ou seja, os versos cantados, também encontravam eco nas paredes e eram refl etidos ao público que os recebia de ouvidos e olhos bem atentos. Sentados ou em pé, os cantadores aos poucos passaram a ocupar os palcos, colocando-se num lugar diferenciado em relação à plateia, passando a agregar elementos que permitiam um maior alcance dos versos. Passando a apresentar-se em lugares maiores, com um público mais vasto e diversifi cado, tornou-se necessário acrescentar uma caixa amplifi cadora às já conhecidas violas, além dos microfones, que deixaram de ser acessórios, compondo defi nitivamente a cena performática da cantoria. A performance, conforme Zumthor (2000), realiza-se a partir do encontro estabelecido entre o produtor e seu público, no momento em que a produção acontece. Os elementos que a constituem dizem respeito não apenas às informações trocadas, mas também à sintonia que se estabelece na troca dos olhares, no modo como o cantador empunha a viola, no modo como olha para a plateia a fi m de ver sua reação diante dos versos, no modo como a plateia vibra ou não diante dos pés proferidos, no som que percorre todo o espaço e envolve os presentes num véu poético que pode até começar no palco, mas que decididamente não se restringe a ele. Passando do pé de parede aos palcos, o cantador passa a ocupar um lugar diferenciado no universo da cantoria. De cima, pode ver como a massa se organiza, pode ver a cadência que toma conta dos corpos que acompanham os versos, ajudando a construí-los. Essa mudança de posição começa a inaugurar um outro meio de produção da cantoria. Os organizadores de cantorias começam a perceber que é possível, e talvez preciso, buscar espaços diferentes para a realização dos encontros entre cantadores. A princípio conduzidos pela mão de intelectuais admiradores da arte de improvisar, os repentistas começam a se apresentar em espaços antes impensados para a realização de cantorias, como teatros até então frequentados pela “alta sociedade”. Aos poucos, foi surgindo e ganhando espaço um modo de organização que tirava os poetas da aparente condição de rivais e os colocava numa relação de parceria. As cantorias organizadas em torno de dois cantadores passaram a contar outros com que se revezavam, formandos duplas que 1 Conforme anteriormente explicitado, na cantoria denomina-se linha ou pé cada produção reconhecida na poesia canônica como verso. Entretanto, o que o canônico chama de estrofe, podiam ser fi xas ou não conforme os gêneros sugeridos, a vontade dos presentes e a predisposição dos poetas. Assim, começou-se a pensar na possibilidade de promover disputas entre duplas, a fi m de ver qual mostrava maior domínio de improvisação, qual fazia valer o nome dos cantadores que carregava. Estava formada, então, uma primeira moda-lidade do que posteriormente veio a ser denominado festival. Deslocados de seu ambiente primeiro, onde acontecia para ser apreciada pelos admira-dores de uma dada localidade rural, a cantoria de improviso passou a ocupar um espaço cada vez maior no universo urbano, inserindo-se na sociedade por outras vias, tirando os repentistas dos pés da parede e os colocando aos pés do grande público.
Pés de parede e festivais: uma peleja com a tradição?
Tendo como base um preconceito fundamentado em princípios de exclusão, há tempos propõe-se uma relação dicotômica entre literatura erudita e literatura popular. Hobsbawm (1997) nos apresenta a ideia de que as tradições são frutos de conjunturas culturais que, num dado contexto, convergem para o desenvolvimento de estratégias que permitam a manu-tenção de práticas que, de outro modo, estariam sujeitas à extinção. Ou seja, inventam-se tradições que, uma vez consolidadas, enraízam-se de tal maneira nas práticas vigentes que a sua execução tende a ser vista como parte de um processo natural, quando, na verdade, o que se tem de fato é a construção de um discurso forjado pelos mais diversos meios, como forma de silenciar e/ou invisibilizar os confl itos inerentes a todo processo de transição, entendendo que os atores que ora se apresentam não precisam nem devem fi gurar como vítimas ou algozes, mas como sujeitos que lutam para a manutenção de um espaço, de uma arte, de uma expressão cultural que precisa negociar suas formas, sua execução com as tantas outras representações que requerem um lugar nesse vasto, embora cerceado, campo de atuação. A necessidade de datar todos os feitos, de impor uma certidão de nascimento para todas as práticas acaba por abrir uma concorrência entre os seus produtores, de modo que cada um, em cada região, vai requerer para si uma base fundadora, um marco que precisa estar documentado. Nessa esteira, entende-se que aqui está se tratando de uma arte com bases orais e que, por sua própria constituição, solicita que os testemunhos, que trazem em si seu valor de verdade (Lemaire, 2007) – que pode variar das bases orais para as bases escritas–, nos habilitem a aceitá-los e a elencá-los como documentais, uma vez são eles que vão apresentar dados oferecidos por sujeitos que participam dos vários e variados processos de produção. Além dos que atuam como elementos que fi guram na primeira cena, como cantadores e públicos, temos também aqueles que trabalham nos bastidores, que colaboram como apologistas2 ou como intermediadores, mas que acompanham de perto o desenvolvimento de uma cena cultural posteriormente entendida como defi nitiva e, portanto, existente desde sempre. Questionando essas tradições supostamente inabaláveis, há de se pensar que a ideia que rotula práticas como eruditas ou populares passou a existir apenas a partir da Idade Média, visto que, até então, todas as práticas eram oferecidas e consumidas igualmente por todas as classes. Uma vez que teve início a elaboração de produtos que visavam públicos diferentes e atribuíam a isso uma qualidade diferenciada, passou-se, então, a verifi car o surgimento de discursos, práticas e produções que visavam consumidores que também passaram a se rotular como diferentes, dando espaço, então, para a constituição das desigualdades. Mas é preciso ressaltar que a diferença e a desigualdade requeridas surgem muito mais como uma construção social e cultural do que baseadas em processos constitutivos dos públicos visados.
As bases teóricas atuais nos apresentam, como bases fundadoras, um cenário pernambucano, nos anos 1940, que se insinua como berço dos festivais (Amorim, 2003), ou um solo paraibano (Ramalho, 2000), que teria surgido por volta dos anos 1970, mas há testemunhos daqueles que afi rmam ter visto produções que passaram a ter espaço já por volta do fi nal dos anos 1920, ou ainda aqueles que vão dizer que os festivais sempre existiram, concomitantes aos pés de parede, mas que só posteriormente passaram a requerer um espaço que os diferenciava. Assim, insinua-se como mais proveitoso perceber quais nuances culturais propiciam o desenvolvimento de eventos com características que os possibilita a denominação de festivais. Entretanto, torna-se necessário destacar que, ao contrário do que se possa questionar, visto que as bases eruditas sempre requerem para si o rótulo de criadoras, enquanto às produções populares resta a alcunha de imitadoras, nesse caso, em particular, percebe-se que os festivais de violeiros surgem muito antes dos festivais de música popular, que passaram a ter espaço apenas a partir dos anos 1960 (Mello, 2008), esvaziando um dos tantos rumores que rondam o universo popular.
2 Apologistas são os responsáveis pela organização das cantorias e nem sempre são cantadores, sendo, em sua maioria, apenas apreciadores da arte de improvisar, conhecendo Cantoria e indústria cultural: parceria ou disputa?
A conjuntura cultural que ora se apresenta nos faz ter contato com práticas culturais que já nascem sob a égide de uma indústria que reivindica que a cultura seja cada vez mais entendida como recurso. Conforme Yúdice (2004, p. 26): Pode-se dizer que a cultura simplesmente se tornou um pretexto para a melhoria sociopolítica e para o crescimento econômico, mas, mesmo se fosse esse o caso, a proliferação de tais argumentos nos fóruns em que se discutem projetos referentes à cultura e ao desenvolvimento locais, bem como na Unesco, no Banco Mundial e na assim chamada sociedade civil globalizada que reúne fundações internacionais e ONGs, todos esses fatores têm operado uma transformação naquilo que entendemos por cultura e o que fazemos em seu nome.
O conceito de cultura tem sofrido modifi cações que o coloca numa condição de indefi nição, ou seria de uma defi nição que varia conforme os interesses de cada setor? Pensando nisso, há de se pensar também nos direitos culturais, assim apresentados: Os direitos culturais incluem a liberdade de se engajar na atividade cultural, falar a língua de sua escolha, ensinar sua língua e cultura a seus fi lhos, identifi car-se com as comunidades culturais de sua escolha, descobrir toda uma variedade de culturas que compreendem o patrimônio mundial, adquirir conhecimento dos direitos humanos, ter uma educação, não deixar representar-se sem consentimento ou ter seu espaço cultural utilizado para publicidade, e ganhar respaldo público para salvaguardar esses direitos. (Yúdice, 2004, p. 41) Uma vez defi nidos o que são direitos culturais, algumas perguntas continuam ecoando: eles realmente existem? Quem os garante? Todos os cidadãos estão cientes disso e os requerem? Entendendo que as práticas culturais se desenvolvem em contextos que defi nem, classifi cam e selecionam as expressões artísticas, baseando-se mais em suas vias de produção, circulação e recepção do que na qualidade do produto ofecerido; em solo brasileiro, a realidade aponta para um eixo cultural que entende a música popular como importante e digna de representação da identidade brasileira apenas se estiver sob o rótulo de Música Popular Brasileira (MPB). As outras expressões que, porventura, usem a alcunha popular estão destinadas a atrair olhares que vão do desprezo ao encantamento, conforme os meios e os modos a que tenham acesso. Receber turistas ao som da viola é o que precisamos para expor essa arte ainda hoje vista como exótica, produção que precisa ser vista, registrada, documentada e explorada enquanto temos a graça de vê-la viva, pois, como toda prática em via de extinção, é preciso encontrar meios para conter as espécies sobreviventes, catalogar e embalsamar os derradeiros representantes, de modo que possam ser colocados em suportes que lhes deem o caráter de fi xos, imutáveis, visto que apenas assim poderão manter-se no seleto rol das produções tradicionais que primam pela manutenção de recursos que não podem, não devem e não querem ser corroídos pelo inexorável tempo. Assim, o que se pode pensar em se tratando da cantoria? O pipocar de discursos que, nas mais várias épocas e nos mais diversos meios, clamam por um resgate que traz em seu bojo a ideia de salvaguardar antes que acabe, nos desperta para a necessidade, essa sim urgente, de mostrar que a estrutura da cantoria, seja ela em pés de parede ou em festivais, traz em si elementos que, ao invés de desaparecer, transmutam-se na tentativa de adequar-se às novas demandas, de agradar a um público ávido por novidades, mas que só as aceita se vierem acompanhadas de aspectos estruturantes que garantam a manutenção de uma arte que, embora secular, incorpora as necessidades de uma pós-modernidade, ou contemporaneidade, conforme queiram, no afã de absorver o que surge com o deliberado interesse de se mostrar atuante e antenado com os anseios de um público que já nasce sob os ditames de indústria cultural que, atrelando-se diretamente aos meios e às urgências capitalistas, importam-se mais com o vendável do que com o admirável. Se os produtos conseguirem agregar esses dois valores apelativos, eis aqui o que se espera dos recursos culturais: que sejam inesgotáveis, mas que mantenham a capacidade de manter-se sempre atuais.
Considerações provisórias e parciais
Por se tratar de um campo que solicita discussões permanentes, entende-se que as refl exões aqui expostas buscam mais a sugestão de questionamentos do que a resposta para os variados confl itos que se fazem presentes na área. Buscar compreender a dinâmica que se faz presente no universo da cantoria de improviso é entender que, embora o nome possa sugerir algo que se dá em torno do processo de improvisação, isso se dá de fato no tocante aos versos produzidos, mesmo que recorram a fórmulas (Havelock, 1993), o que colabora inclusive para o desenvolvimento da poética envolvida, mas que, no que se refere à confi guração das produções, não há em sua estrutura nada que remeta ao improviso, visto tratar-se de uma produção que atende a ditames formais norteados por métrica, rima e oração3, com regras rígidas, cujo descumprimento pode prejudicar a imagem do cantador e seu prestígio diante do público. As tensões que circundam as relações entre os repentistas e entre esses e seu público indicam que o princípio do jogo está o tempo inteiro presente (Huizinga, 2008), mas esse deve ser aqui entendido como algo em torno do qual giram e se fomentam as identidades que têm sua constituição diretamente relacionada ao próprio desenvolvimento do espetáculo, pois é no momento da performance que os atores assumem, no jogo do improviso, funções predeterminadas que requerem posturas que correspondam ao que se espera, sob o risco da desobediência às regras ser vista como um desrespeito à dinâmica envolvida. Assim, espera-se que as discussões aqui propostas colaborem para o desenvolvimento de posturas diferenciadas, que vejam e ouçam essa expressão oral, indubitavelmente representante da cultura brasileira, pelas vias da arte, cujo conceito também precisa ser paulatinamente revisto, a fi m de incorporar práticas que não podem e não devem ser inseridas sob outra denominação que não a artística.
Referências bibliográfi cas
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HOBSBAWM, Eric (1997). “A invenção das tradições”. In: ______ e RANGER, Terence (org.). A invenção das tradições. Trad. Celina Cardim Cavalcante. 4. ed. 3 A métrica está relacionada à quantidade de sílabas métricas, enquanto a rima é responsável também pela produção do ritmo, que precisa corresponder à cadência da voz, e estabelecer uma simetria entre os pés, uma vez que o não enquadramento destes ocasiona a produção de um pé quebrado, denominação dada aos pés que destoam dos demais por apresentar mais ou menos sílabas métricas. A oração é responsável pela coerência entre os pés e os versos produzidos por cada cantador, assim como pela relação lógica existente entre as construções de cada cantador dentro do mesmo repente.
HUIZINGA, Johan (2008). Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. Trad. João Paulo Monteiro. São Paulo: Perspectiva.
LEMAIRE, Ria (2007). Entre oralidade e escrita: as verdades da verdade. MELLO, Zuza Homem de (2008). A era dos festivais: uma parábola. São Paulo: ORTIZ, Renato (2006). Cultura brasileira e identidade nacional. São Paulo: RAMALHO, Elba Braga (2000). Cantoria nordestina: música e palavra. São YÚDICE, George (2004). A conveniência da cultura: usos da cultura na era global. Trad. Marie-Anne Kremer. Belo Horinzonte: Editora UFMG.
ZUMTHOR, Paul (2000). Performance, recepção, leitura. Trad. Jerusa Pires Ferreira e Suely Fenerich. São Paulo: Educ.
Recebido em abril de 2010.
Aprovado para publicação em maio de 2010.
Resumo/Abstract
Na rota dos festivais, uma tradição que se renova
Andréa Betânia da Silva
A oralidade é um espaço profícuo para o desenvolvimento de pesquisas e refl exões que
busquem alterar, ou ao menos repensar, os alicerces teóricos que ora já não se apresentam tão fi rmes. Nessa esteira, o presente artigo volta-se para uma trajetória estabelecida na cantoria nordestina de improviso, mais especifi camente no universo do repente, indo dos “pés de parede” aos festivais de violeiros que se espalham pelo Nordeste, visando perceber que contextos culturais propiciaram, se não a invenção, ao menos a renovação de uma tradição.
Palavras-chave: cantoria de improviso, oralidades, culturas
In the festivals route, a tradition that renews itself
Andréa Betânia da Silva
Orality is an advantageous space to the development of research and thinking that aims
at altering, or at least re-thinking, theoretical bases that seem quite strong. In this aim, the present article looks at a trajectory established in Northeast Brazil’s improvised singing, more specifi cally the universe of poetic match, coming from the “pés de parede” (simple matches) to the festivals of guitar players that spread themselves through Northeast Brazil, aiming to realize that cultural contexts gave birth, if not to invention, at least the renewal of a tradition.
Key words: improvised singing, orality, culture
Andréa Betânia da Silva – “Na rota dos festivais, uma tradição que se renova”. Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, n. 35. Brasília, janeiro-junho de 2010, p. 183-192.

Source: http://www.gelbc.com.br/pdf_revista/3512.pdf

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