RESENHAS CALDEIRA, Teresa P. do Rio. 2000. Ci- dade de Muros: Crime, Segregação e
disjuntiva”. Este conceito, embora não
Cidadania em São Paulo. São Paulo: Editora 34/Edusp. 399 pp.
vro, é a mola mestra da argumentaçãoda autora. Caldeira avalia que uma dasmaiores contradições do Brasil contem-
Andréa Moraes Alves
processo de transição democrática, sedesenvolveu pari passu com a deslegi-
gência de uma noção de espaço públi-
na, a instituição policial, os direitos hu-
manos e as práticas de privatização do
ceu o livro Cidade de Muros: Crime,Segregação e Cidadania em São Paulo.
fronteiras nítidas entre o bem e o mal.
cursos em relação à criminalidade, às
instituições democráticas e aos direitos
entrevistas, mostrar esse princípio clas-
Itália, que se refere a outros migrantes
Violence: Disjunctions of Brazilian Citi-
RESENHAS
sição estanques. “Essas dicotomias for-
çam distinções que não existem na vida
tanciamentos. O princípio classificató-
que estaria mais próxima do narrador –
é diferente – de outra classe social –,
sociais” (:141-142). A autora afirma que
que essa criação de fronteiras não se li-
tência de contradições entre relações
ros de elite da cidade de São Paulo.
“democracia disjuntiva”: a instituição
zaria nossa “modernidade incompleta”.
policial e os “enclaves fortificados”. Os
Teresa Caldeira critica esta noção por-
que, para ela, “a questão central não é
se há formações sociais com princípios
e práticas contraditórios, algo que po-
vemos interpretar essas contradições.”
cos. São voltados para o interior e não
práticas policiais e sobre a construção
em direção à rua, cuja vida pública re-
de muros, grades e fortificações em re-
sidências e áreas comerciais da cidade,
a autora recorre a um raciocínio polari-
são e exclusão.” (:258) A polícia e os
dizem sua crítica teórica. O fracasso das
tos humanos é atribuído a uma “cultura
de violência” que imperaria na própria
instituição policial e na sociedade como
um todo, cultura esta que justifica práti-
ráter disjuntivo de nossa democracia.
mínios fechados e shoppings centers
paço público moderno – heterogêneo e
blico/privado, legal/ilegal não são rigi-
RESENHAS
dos direitos civis e de suas instituições;
do outro, a lógica da violência e da se-
senvolvimento da democracia no país.
mocrática da tradição liberal em oposi-
as práticas policiais e sobre a vida coti-
diana nos “enclaves fortificados” evi-
lência são as marcas desses espaços.
ção da “sociedade liberal e democráti-
do de direito e os espaços públicos, co-
duos fazem de sua própria sociedade.
dernidade peculiar”, cuja marca distin-
tiva está na fragilidade dos direitos ci-
dade – mais um estereótipo –, com uma
sistência à expansão da democracia pa-
ra, das relações sociais e da vida coti-
tência, Caldeira aponta a concepção de
tes em países de tradição liberal – bas-
como ato tido como legítimo, à violên-
dos Unidos. Lá, também, a circunscrição
cia doméstica, à prática indiscriminada
leira construiu uma relação “incircuns-
crita e manipulável” com o corpo. Essa
relação flexível acaba por não permitir
RESENHAS
dello), antropólogos biológicos (Rober-
çar. Uma investigação sobre as práticas
gu de passado totalmente desconheci-do antes da primeira expedição de Karlvon den Steinen em 1884 e, após a mes-
FRANCHETTO, Bruna e HECKENBER- GER, Michael (orgs.). 2001. Os Povos do Alto Xingu: História e Cultura. Rio de Janeiro: Editora UFRJ. 496 pp.
gos de Heckenberger, dado o períodode mais de mil anos que cobrem e a
Julio Cezar Melatti
tos culturais que apresentam, como umesquema de pontos de referência aos
mentos escritos e memória indígena.
sentantes de cada família lingüística na
área e ensaia uma periodização. Os pri-
logia atestam sua presença milenar.
rios Teles Pires e Arinos, todos estão na
seus núcleos habitacionais e outro esti-
lo cerâmico, até virem a convergir para
Bastos, Edir Pina de Barros, Aristóteles
RESENHAS
fusão de moléstias contagiosas. Os Tupi
e pregadoras da boa vontade, foi e é im-
nutenção de todo o sistema xinguano.
sistência, governamental atua à distân-
bam por se transferir todos os Bakairi.
ças em distintos domínios. Já Aristóte-
mínios – o mítico, o ritual, o xamânico,
o cotidiano da vida aldeã – e ainda pe-
dade de relacionar os vestígios pré-his-
tóricos aos povos que atualmente ali vi-
rísticas das línguas karib, da qualifica-
Regionais” e “Visões Locais”. Inspira-
to Grosso, a Fundação Brasil Central, a
Força Aérea Brasileira, o Serviço de Pro-
teção aos Índios, envolvidas nos proce-
gor, incluído nas “Visões Regionais”. RESENHAS
acentuar a articulação entre eles, não
ra a alteração de suas relações com os
to do SPI que não se destinava a apoiá-
los, mas sim à atração e assistência dos
ros, há outros seis na parte “Visões Lo-
cais”. Por força mesmo da articulação
nir essas contribuições para uma histó-
mas quase ilegível. Se lhe fosse retira-
RESENHAS
nhado das pequenas correntes d’água.
as pessoas” – a frase de uma informan-
te, que serve de epígrafe, expressa sin-
Harris se propõe a resolver: as relações
tes na literatura sobre a região amazô-
des: ameríndios vários, campesinatosdiferenciados, seringueiros, madeirei-ros, grandes cidades com elites e classe
HARRIS, Mark. 2000. Life on the Ama- zon. The Anthropology of a Brazilian
co”, “indígena” ou “cidadão brasilei-
Peasant Village. Oxford: Oxford Uni- versity Press/The British Academy.
tuar ou localizar essas identidades nopanorama das mudanças históricas queafetam a prática da vida diária na Ama-
Marco Antonio Gonçalves
mais identidades, uma vez que estassão construídas nessa prática. Em tal
definida, não há centro: o que existe são
mazonas é a metonímia do “ser amazô-
tir da etnografia, uma nova reflexão so-
RESENHAS
nais – “As Marés da História na Ama-
zônia”, “Continuidade e Recursos”,
“Nós Somos Todos Família Aqui”, “Rit-
mos”, “Trabalho como Vida” e “Fron-
nova acepção, identidade é dada ou ex-
sua experiência e o sentido teórico que
tros: “O Curso do Rio”, “Caboclo”, “Pes-
cando com José Maria”, “Entre Dois Ir-
mãos”, “Outra Maneira de Contar” (um
ensaio fotográfico), “Possessão”, “Fe-
chando o Círculo”. Essa dupla estrutu-
dades e aquilo que é irrepresentável no
de histórias “intersubjetivas e conecti-
tidade por definição antiintelectualista,
história, seu modo específico de socia-
criação de abstrações da ordem da cul-
“acomodação” ou “adaptação”. O au-
de uma acomodação às forças externas;
cal e o global, fazendo mediações entre
constituição no contexto das relações
gica. Os capítulos são divididos em dois
RESENHAS
pologia. A narrativa “Caboclo” contes-
experienciam as diferentes estações.
des. Percebe que o “trabalho” não é
mas, pelo contrário, “trabalho” está li-
guindo os modelos clássicos e, por isso,
“ação/corpo/consciência”, apostando
mãos” revela a riqueza das histórias de
vida para a construção de explicações
sociológicas: dois irmãos, dois destinos,
do autor em não hipostasiar a cultura, a
estratégias propostas pelo autor não se
de “tipos sociais” e procurar compreen-
na ou à assunção de uma espécie de in-
“identidade”: abordá-lo na materiali-
Caboclo. Procurando não reificá-la ain-
da mais, prefere usar os termos “ribeiri-
nho” ou “camponês”. O uso do termo
riências etnográficas que lhe servem de
RESENHAS
modelo. É o caso de Pálsson, que define
o método antropológico como “discurso
vivo”, característico de um “diálogo de-
do, apresentada na mesma instituição.
mocrático” em que antropólogo e nati-
tropologia da política”, e procura anali-
e seu anfitrião) não estão submetidos à
sar as práticas políticas em função das
cultura, à história e às políticas econô-
de “anatomia vivida”, também inspira
ência política a partir da observação
mente situadas no tempo e no espaço.
iluminar uma série de relações sutis en-
tre os diversos aspectos da política lo-
apreciação de que existe uma “cultura
nicipal, isto é, valores e pontos de vista
gras da atividade parlamentar, o prestí-
se dessa “cultura institucional” permi-
oportunidades não são simples técnicas
de Kuschnir – e esta é a segunda chavede sua análise – de que“o papel socialdos vereadores está, em muitos casos,
KUSCHNIR, Karina. 2000. Eleições e Re- presentação no Rio de Janeiro. Rio de
de de mediar trocas entre diferentes ní-
Janeiro: Relume-Dumará/NuAP-MN- UFRJ. 95 pp.
ferentes níveis de cultura, com códigose valores distintos” (:9). Tal papel é, defato, sancionado pela “cultura institu-
Fernando Alberto Balbi
tem como um de seus valores básicos opostulado de que a mediação entre os
eleitores e o Executivo é um dos princi-
RESENHAS vertente de assistência à população”
ção dos vereadores. No capítulo 1, Kus-
(:45). Mesmo assim, os vereadores – se-
jam “ideológicos” ou “assistencialis-
res culturais”, ponto que é desenvolvi-
eleitorados certas classes de vínculos.
mental, conscientes de que “num certonível de atuação, o voto dado (a favor
através da proposição de um tipo espe-
nificar voto retribuído” (:52). Isso se re-
cífico de intercâmbio voto/mandato.
terem um “bom trânsito” e à capacida-
uma estratégia “comunitária/assisten-
cialista” e outra “ideológica/política”.
“bom trânsito” se vê afetado pela ne-
do jogo político. Com efeito, é impossí-
em torno da atividade política, que não
da solidificação de alianças – tarefa que
ca de votos” (:58), e o voto só serve co-
um “bom trânsito” e o imperativo de es-
tabelecer alianças duráveis – que dá
dores “assistencialistas” e os “ideológi-
de dos blocos de “situação” e “oposi-
ção” – constitui um “conflito entre dois
mente a criar e reproduzir relações pes-
prescritos pelo grupo” (:58) que os ve-
sua participação no “processo político”
RESENHAS
que “não está inscrita nas atribuições
díspares. O político seria, em última ins-
datos de seus ocupantes” (:68). Essa as-
“as características mais gerais de uma
desprestigiando-o diante da opinião pú-
uma “defesa institucional” da Câmara,
com o intuito de reforçar seu prestígio
sa febril criatividade teórica parece ter-
pressões em favor da diferenciação sim-
o status político do parlamento carioca
na estrutura de distribuição de poder e
prestígio nacional” (:78), reivindicando
a herança cultural e histórica da cida-
análise qualquer à inteligibilidade dos
to Velho, o capítulo 5 distancia-se do tom
to de como se os usa. O trabalho de Ka-
etnográfico do restante do livro para si-
rio, com uma arquitetura teórica de ins-
nios e províncias de significado” (:83)
buição valiosa à análise de uma insti-
tuição complexa e de uma posição polí-
presentação do self de modo a transitar
por essas províncias de significado. Es-
se tipo de trajetória possibilita a alguns
la Kuschnir parecem “reais”: não há
tre categorias sociais, domínios e níveis
de cultura. Tal seria o caso dos vereado-
res e, de modo mais geral, dos políticos,
RESENHAS
parte é, nesse sentido, bastante explíci-
realistas da etnografia clássica – é uma
to: “À procura do povo português”.
pelo termo antropologia portuguesa
de ela não ter aproveitado a ocasião de
nar amplo. Isto significa que tais refle-
leitor se devem não à qualidade da aná-
minar etnografias espontâneas.
gráfico – ao que essa resenha não faz
justiça – e de um livro particularmente
dos na análise das instituições legislati-
leitura diacrônica e linear, já que, como
tratados sob os rótulos de “assistencia-
lismo”, “clientelismo” e “corrupção”.
a própria amplitude temporal do livroobriga o autor a expor, no primeiro ca-pítulo, as diferentes etapas que a an-
LEAL, João. 2000. Etnografias Portu-
tropologia portuguesa e seus “etnógra-
guesas (1870-1970). Cultura Popular e
fos espontâneos” teriam atravessado. Identidade Nacional. Lisboa: Publica- ções Dom Quixote. 274 pp.
das de 1870 e 1880. Neste período, acultura popular é vista como um uni-verso formado quase que exclusiva-
Lorenzo Macagno
mente pela literatura e pelas tradições
populares. Um segundo grande perío-do corresponde à virada do século. É o
Etnografias Portuguesas procura mos-
da I República. Além da literatura e das
cendência com qualidades específicas.
dutores de tais tradições. Tal é o caso
grafia e da antropologia em seu país.
tos in loco, que se estendem por todo o
RESENHAS
concepção historicista da cultura popu-
lar. Por isso, o camponês é visto, sobre-
clusivismo das teses lusitanistas foi per-
como uma espécie de primitivo moder-no. Já no terceiro período, que vai de
terior adesão ao luso-tropicalismo.
teralmente, em “etnografia artística”,
nário nacional português. Nessas discus-
de atores, que o autor distribui em três
ensaio pioneiro O Cruel e Triste Fado
(1897), cuja caracterização negativa da
alma nacional chega ao ponto extremo.
fine como a invenção da saudade. Sen-
variadas (artistas, arquitetos, músicos)
trará eco em algumas derivações da et-
discurso etnográfico do Estado Novo.
ses são o prelúdio para que, na década
ção mais sistemática e influente sobre
sitanistas foi o arqueólogo Joaquim Sar-
RESENHAS Popular em Portugal. O Inquérito bus-
ca ir um pouco além das críticas refor-
Raul Lino como impulsionador do Mo-
vimento da Casa Portuguesa e, portan-
do o país. Em sua qualidade de críticos
anos 30, o Movimento da Casa Portu-guesa foi contestado e questionado por
sa”, o autor coloca os arquitetos do In-
um grupo de “etnógrafos espontâneos”:
quérito na mesma sintonia das contri-
época, realizaram um amplo Inquéritoà Habitação Rural, cuja metodologia
vincial (que compõe a terceira e última
parte do livro: “Nação e região: répli-
cas, apropriações, resistências”). João
ção, o vicejo da cor, para passar a ser
gularidade (atribuível, entre outras coi-
sas, a seu caráter insular) opera em tor-
séria, a sujidade, a falta de condições
higiênicas, o cheiro nauseabundo, etc.”
lado, as tentações culturalistas (ampa-
ção estetizante); de outro, os apelos in-
de uma espécie de reformismo social.
de textos específicos. Não é problema-
tâneos”. Trata-se, desta vez, de um gru-
ral redigiu o Inquérito à ArquiteturaRESENHAS
tração o combate à corrupção. Sua dis-
de “etnógrafos espontâneos”, dissemi-
nados por todo o ultramar português.
direcionar a própria discussão em torno
ção ultramarina. O próprio Jorge Dias,
gráfico, a refletir em um tom lusotropi-
políticas públicas no México e, por ou-
feito, através dos porta-vozes do “po-
vo” e da “cultura popular”, é possível
Vicios Públicos, Virtudes Privadas:La Corrupción en México originou-sedo simpósio “Corrupção e Sociedadeno México”, realizado em fins de 1995
LOMNITZ, Claudio (org.). 2000. Vicios Públicos, Virtudes Privadas: La Cor-
prefácio e da introdução, que pode ser
rupción en México. México: CIESAS/ Miguel Angel Porrua. 294 pp.
onde são apresentadas hipóteses equestões que articulam os textos, am-bos elaborados pelo organizador, com-
Marcos Otavio Bezerra
Professor, Departamento de Sociologia da UFF
por historiadores, sociólogos, antropó-logos e cientistas políticos. Os textos
são dispostos em três partes: “Corrup-
RESENHAS
“Corrupção e Formação de Classes So-
de trajetórias políticas e empresariais e
ciais no Século XX” e “Corrupção, Ri-
tual Político e Sacralização do Estado”.
tribuição mais direta: a transformação
e práticas sociais rotineiras. Essa preo-
histórica dos discursos da corrupção e
corrupção administrativa e política no
ciais; a associação entre corrupção e re-
presentação política. Pensado a partir
de sua variação de sentido e diversida-
mo ela se associa à moral religiosa, às
construção de reflexões sobre as socie-
ações políticos e às atividades lúdicas
teceder, os princípios de ação e as rela-
casos, a corrupção não é descrita como
ou instituições; ao contrário, o que é res-
saltado é o modo como estas e as práti-
elaboração de análises consistentes so-
é a da existência de um conjunto de re-
des pessoais (constituídas por relações
estes últimos, essas ligações proporcio-
cação ou aplicação em condições favo-
utilização e apropriação privada de re-
mobilização de estratégias de análise
cursos públicos (simbólicos e materiais).
ção social cuja interpretação se assenta
sitoriais e jurídicos do período colonial,
em elementos históricos e culturais.
cias de imprensa, de observação direta,
RESENHAS
(“Control de la Iglesia y Transgresiones
nial”) contribui para a discussão sobre
a dimensão histórica da noção de cor-
gressões de caráter civil e religioso co-
econômico. L. Astorga (“Traficantes de
Drogas, Políticos y Policías en el Siglo
fuerza”, um dispositivo jurídico, como
período colonial. E. Semo (“De la Colo-
ginaria entre lo Público y lo Privado”)
políticos e administrativos do Estado. F.
V. Ugalde (“La Corrupción y las Trans-
mo”) por parte do Estado, Igreja e oli-
ção, além de ser um elemento constitu-
(“La Corrupción y la Revolución Mexi-
características são definidas pelo presi-
cana”), a partir do estudo das várias fa-
recursos para a burguesia nacional. S.
D. Morris (“¿‘La Política Acostumbrada’
o ‘Política Insólita’? El Problema de la
neo“) se propõe a discutir os fundamen-
dutas feito pelos revolucionários e a so-
ciedade. G. de la Peña (“Corrupción e
to de mudanças sociais e políticas mais
‘Sentimientos de la Nación’”) centra-se
na discussão da constituição de esferas
públicas, no papel dos rituais na forma-
ção de comunidades políticas e na arti-
culação desses espaços através de ri-
cuniários. D. Nugent (“La Corrupción a
tuais políticos cuja realização supõe for-
um Puesto Político”) analisa a ascensão
sobre el Significado Político de la Cor-
RESENHAS MARGARIDO, Alfredo. 2000. A Luso- fonia e os Lusófonos: Novos Mitos Portugueses. Lisboa: Edições Univer- sitárias Lusófonas. 89 pp.
de sua inscrição nas representações epráticas cotidianas das entidades e ins-tituições públicas e privadas é respon-
Igor José de Renó Machado
sável pelas contribuições mais signifi-
cativas dos textos, essa maior atençãoconferida aos fenômenos aos quais a
O livro A Lusofonia e os Lusófonos é
de importantes jornais e intelectuais or-
utilização do “recurso de fuerza”, o exa-
trução de espaços públicos e rituais –,
gal), é insidiosa e efetiva na relação de
fundam essa espécie de silêncio – que
lônias. Nesse sentido, a lusofonia afeta
contarmos apenas os números oficiais.
Banco Mundial e G-7) – ainda estão por
terial empírico. Nesse contexto, os arti-
uma louvável contribuição para a intro-
gando a história colonial e as relações
trole da língua “mãe”. A importância da
RESENHAS
ções e, após 1974, quando se lhe confe-
nial português a reafirmar os “direitos”
re o papel que foi dos territórios coloni-
às demais colônias e populações. Esse
se cada vez mais as populações “resi-
duais” dos tempos coloniais – os imi-
pretensão de um “espaço lusófono” e o
essa violência racista é dirigida, em ca-
tugal, são os cabo-verdianos o alvo pre-
tuguês. Mas o luso-tropicalismo só exis-
que já era ruim é mutilado para servir à
um projeto missionário de “civilização”
do, pós-colonial), agora focado na lín-
possibilidade de modernização do país.
alternativo”, que luta contra a lusofo-
posto “espaço lusófono” e uma história
principais críticos do colonialismo por-
um intelectual “contra-hegemônico”.
nos, francófonos ou hispanófonos reais,
da época colonial. No Brasil e nos paí-
ses africanos (até 1961) não se criaram
do passado, como se o “Outro” só exis-
dos “fora da história” e só “entram na
ção” (:51). A língua passa a ser, depois
RESENHAS
com a presença do falar brasileiro, Mar-
nial, e “a exacerbação da ‘lusofonia’
assenta nesse estrume teórico” (:57).
leira a mais bonita, maleável e “eróti-
güística é baseada na religião, convi-
tionável recorrer, para criticar a lusofo-
própria reproduz, ao acentuar o caráter
etnismo com a língua é uma relação de
“erótico” do português falado no Bra-
reciprocidade, ou seja, é a relação so-
cial que tende a criar a língua, portan-
nia é a separação entre civilização e
o processo civilizatório e a língua equi-
ga o peso dos “costumes” nas conside-
vale a “civilizar”. Se assim é, o apelo à
rações sobre a língua, fazendo com que
“natureza erótica” da fala do brasileiro
tuguês (minha pátria é minha língua.
brasileiro erotizado é rebaixado ao pó-
mas quem é que manda nessa pátria?).
lo “selvagem” dessa divisão básica do
A idéia de uma pátria lingüística é uma
discurso lusófono. De fato, não é a fala
do brasileiro que é erótica (afinal, o que
brasileira em Portugal, através do avan-
da erótica. Isto por si só dá a entender
ço da mídia brasileira na Lusitânia. Na
ao leitor brasileiro a força desse discur-
por reduzi-la a um sinal da “criativida-
de” natural do brasileiro. Esse falar bra-
“doce paraíso da dominação lingüística
sileiro “criativizado” pelos portugueses
criatividade e a criação artística são o
natural criatividade do brasileiro é mais
acrescentaria] só podem ser inferiores”
lectual, pois ao criativo é negada a ra-
ta de manutenção das distâncias racis-
detestável a presença da fala brasileira.
vocação que é elevar a língua brasilei-
ra ao status de “língua oficial” da su-
RESENHAS OLIVEIRA, João Pacheco de. 1999. En- saios em Antropologia Histórica. Rio de Janeiro: Editora UFRJ. 272 pp.
ma (e dolorida) ironia que os imigran-tes sirvam como o campo preferencialde reordenação simbólica da ordem
John M. Monteiro
Professor, Departamento de Antropologia,
da lusofonia debatido por Margaridopraticamente não faça o menor sentido
Dividido em quatro partes, Ensaios em
(o que é ótimo e dói nos ouvidos portu-
Antropologia Histórica reúne oito tex-
gueses), para os países africanos recém-
saídos do – e destruídos pelo – período
colonial, a temática lusófona é, no mí-
tar ao potencial público objeto da ideo-
logia “lusófona”, os falantes de portu-
telação de observações perspicazes, per-
cepções originais e lições pertinentes
la, São Tomé, Cabo Verde e Guiné), se-
em explicitar suas opções teóricas, suas
quanto etnógrafo, cientista social e ci-
brasileiros e africanos das ex-colônias,
dadão enfrenta neste início de milênio.
realizará na prática. A busca por direi-
longo dos oito capítulos. Já na apresen-
tos “especiais” baseados na lusofonia
tação, o autor estabelece que, “[n]este
livro, a dimensão histórica foi escolhida
ça essa “ideologia-estrume” (no dizer
do Brasil”, pois, segundo ele, uma com-
preensão dessas sociedades e culturas“não pode passar sem uma reflexão euma recuperação críticas de sua dimen-são histórica”. Por “dimensão históri-ca” ele entende os “eixos espaço-tem-porais” nos quais os indígenas atuamcomo “sujeitos históricos plenos” (:8). Se este caminho já vem sendo trilhadona etnologia brasileira há algum tem-po, ainda persiste no Brasil a imagem
RESENHAS
prisioneiros de uma idade da pedra. “É
preciso”, escreve João Pacheco, “reti-
imagem favorável entre os índios (“Foi
mante). Criticando as limitações de uma
“análise situacional” para explicar a
histórico múltiplo e diferenciado” (:9).
peso decisivo às “tradições culturais”
mobilização e a autoridade de que a sua
atrás, o autor busca atualizar o signifi-
rência às crenças e costumes tradicio-
chave – como a de “situação” – para os
desafios da etnologia no Brasil hoje. Há
situação para tudo quanto é gosto: si-
de Curt Nimuendajú entre os Ticuna.
tuação colonial, situação histórica, si-
tuação etnográfica, situação de pesqui-
sa, situação de perícia. Destas, a que
realizar uma “etnografia da situação de
mensão histórica diz respeito não ape-
do as tradições nativas, os brancos de-
Nimuendajú, é claro, não constituía um
meira parte do livro, cujo título tão am-
nica”) esconde o caráter específico do
ebulição, o etnólogo alemão explicitou
objeto: a história ticuna. No texto ini-
cial, Oliveira coteja “uma narrativa his-
tórica convencional”, isto é, baseada
loísa Alberto Torres: “Fiz uma romaria
“possível história indígena”, esta pre-
tia deles por mim” (:73). Mais uma vez,
dicada na “atualização, dentro de de-
narrativa da tradição ticuna” (:55). A
RESENHAS
trovertido artigo que apareceu em Ma-
na em 1998, no qual o autor critica os
de na análise da “situação etnográfica”,
estudos “americanistas” por seu “des-
uma conjuntura histórica específica es-
conforto” diante das “populações indí-
truturada em torno da “tríade” forma-
genas de baixa distintividade cultural”
(:99). O texto gira em torno de três te-
sobre os índios nessa tríade, o papel de
Brasil. As teses são, na verdade, strawmen, ou seja, construções do próprio
e estímulo à resistência por parte dos
outros que não são claramente identifi-
o autor, nota-se “o involuntário (e qua-
suposição de que “os índios (tal como
falamos deles hoje) sempre existiram”.
tes”. À medida que os antropólogos lu-
tam contra a reificação da cultura e das
“singularidade” da etnologia brasilei-
como o etnônimo e um território “histó-
ta”. Reatualizado de maneira dramática
rico”. O que leva, aliás, à segunda tese-
em anos recentes, esse “nexo latente”
problema: esta diz respeito à “conexão
nas intervenções públicas dos etnólo-
geográfico”. Nesse ponto, o autor con-
sidera infrutíferos os esforços de antro-
nas suas relações com os índios e a so-
nos esforços interpretativos” (:90-91).
fragmentação e reconstituição das uni-
latente. A parte II (“Atravessando Fron-
Essa idéia de “fluxos culturais”, em-
teiras Étnicas”) traz dois ensaios sobre
a “mistura”, o que pode se referir tanto
rece na crítica à terceira e mais proble-
quanto à mestiçagem interdisciplinar. RESENHAS
possível autor da frase: “[P]ara conhe-
da presença de instituições coloniais”.
cia ao contato e ao colonialismo na aná-
lise e na explicação das estruturas so-
ciais e simbólicas dos índios. Mas o au-
te. Também se refere à idealização da
cultura indígena presente nos clássicos
égide da noção de aculturação e, por-
tural. Mas a crítica parece se dirigir a
nistas”, ou seja, à área de estudos et-
Amazônia. Para o autor, entre as “prio-
ridades e premissas” desses estudos fi-
zação da situação colonial e ainda [uma]
gar dos índios na formação histórica do
discutidas, segundo o autor, “à luz de
gradação da noção de antropologia his-
uma antropologia histórica” (:118, ên-
como artefatos do passado, “fósseis vi-
de concepções distintas de história e de
agendas diferentes para a etnologia.
são/inclusão. O “senso comum” susten-
ta que os índios são sempre “exteriores
história nos estudos americanistas. Nes-
à sociedade nacional” (:130), o que le-
tes, “a história é somente um veículo
lações em categorias genéricas de clas-
sificação social, freqüentemente refe-
RESENHAS
“emergência étnica” (A Viagem de Vol-
dio” desloca-o para o passado, “seja aos
ta). Diferente do viajante onisciente do
primeiros capítulos da História do Bra-
cai inevitavelmente nos blurred gen-
sil” (:196). Mas esse deslocamento é re-
res: é simultaneamente navegador e
aprendiz, é tanto sujeito quanto objeto.
vação do mito da avó índia caçada a la-
Sensível à força das categorias colonia-
te quanto no interior paulista ou catari-
tiva. É ele que é batizado, é ele que ex-
índios às famílias brasileiras – sempre
pensa em “utilizar a própria experiên-
sobre a relação entre situação etnográ-
nas Gerais) – realça o caráter ambíguo
fica e produção científica” (:259). Em
da exclusão e levanta questões interes-
santes sobre o laço entre o “senso co-
mum”, o pensamento social e a política
ra que apresenta o livro, Ensaios emAntropologia Histórica entra no roteiro
profissão. É uma leitura importante tam-
lemas políticos e, sobretudo, da respon-
o “peculiar desconforto” inicial do et-nógrafo ao se defrontar com a tarefa daauto-etnografia (desconforto, aliás, não
RICARDO, Carlos Alberto (ed.). 2000. Povos Indígenas no Brasil, 1996-2000. São Paulo: Instituto Socioambiental. 832 pp. (mapas, ilustrações, gráficos, tabelas).
ensaios do livro. Encontramos, nestaseção final, uma última variante da“antropologia histórica”: trata-se do
Francisco Silva Noelli
Professor, Universidade Estadual de Maringá
tidos a uma (auto)análise processual. Investindo no estilo, o autor conduz o
obrigatória consolida e coroa o esforço
através da metáfora da viagem – metá-
terminação dos 350 (ou 500) mil “indí-
RESENHAS
genas” no Brasil, dando continuidade à
fias, família/língua, UF (Brasil), países
publicação dos balanços/relatórios Po-
vos Indígenas no Brasil 1987-1990 e Po-vos Indígenas no Brasil 1991-1995. Tra-
ta-se de um sólido guia que traça o per-
gionais sobre as populações, a situação
jurídica das suas terras e várias outras
dentre todas as edições de Povos Indí-genas no Brasil, está ricamente rechea-
mentários sobre a legislação atual, so-
bre os projetos de lei em tramitação no
so de elaboração. Foram realizadas aná-
nhão do início do século XVII. É com-
biológico tradicional, camuflados no bo-
cos, indígenas, indigenistas, jornalistas
e não-índios. Estão incluídos quadros
dos povos indígenas. A análise das res-
tos de lei que retratam a situação jurí-
identificar locais e temas diversos, des-
de a posição geográfica das TIs até as-
las, com destaque para a “lista dos po-
RESENHAS
cação indígena, a exploração e as pre-
tensões para exploração do subsolo das
TIs, a questão das missões religiosas, o
terminação dos povos indígenas, basea-
tíficos. Essa atuação não decorre ape-
mentais de desenvolvimento regional.
políticos, científicos, jurídicos e huma-
questão da saúde e das doenças, o avan-
nitários. A construção contínua do ban-
dos Povos Indígenas no Brasil, são re-
veladoras do alto nível profissional, da
mos de instituições brasileiras e da ca-
lutas muito duras. Enfim, é um livro que
centemente, matando 3% dos Araweté.
indígena no Brasil do fim do século XX.
povos indígenas vêm distribuídas con-forme uma divisão geográfica preesta-belecida: 1) nordeste amazônico; 2) Ro-raima lavrado/Roraima mata; 3) Ama-pá/norte do Pará; 4) Solimões; 5) Java-ri; 6) Juruá/Jutaí/Purus; 7) Tapajós/Ma-deira; 8) sudeste do Pará; 9) Nordeste;10) Acre; 11) Rondônia; 12) oeste doMato Grosso; 13) Parque Indígena doXingu; 14) Goiás/Tocantins/Maranhão;15) leste do Mato Grosso; 16) Leste; 17)Mato Grosso do Sul; 18) Sul. Para todasas regiões foram incluídas notícias so-bre as TIs e alguns artigos que sinteti-zam as diversas questões e eventos queocorreram nos últimos anos e um resu-mo dos processos históricos mais signi-
19805 North Creek Pkwy, Bothell, WA 98011 SAMPLES WITHOUT CLIENT AND PATIENT ID WILL NOT BE PROCESSED I. Client Information (New clients complete shaded area) II. Patient Information (Complete shaded area or attach information) III. Billing Information A copy of the front and back of insurance card (including Medicare and/or Medicaid) and patient demographics/face sheet must be attached